sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

DIREITO CIVIL I

Das Pessoas Jurídicas

Conceito

O homem não vive isolado, é um ser eminentemente social, e nem sempre suas necessidades e interesses podem ser atendidos sem a participação e cooperação de outras pessoas, em razão de suas limitações individuais, razão pela qual, desde os tempos mais primitivos até os tempos modernos essa necessidade de se agrupar para atingir uma necessidade, para alcançar um objetivo ou ideal comum, foi observada e o direito não podia ignorar as unidades coletivas, criadas pela evolução histórica ou pela vontade dos homens, passando, então, a discipliná-las para que possam participar da vida jurídica como sujeitos de direitos.

A pessoa jurídica é, portanto, proveniente desse fenômeno histórico e social e consiste num conjunto de pessoas ou bens, dotado de personalidade jurídica própria e constituído na forma da lei, para a consecução de fins comuns.

Pode-se afirmar que a pessoa jurídica é, pois, uma entidade a que a lei confere personalidade, capacitando-a a ser sujeito de direitos e obrigações. Sua principal característica, portanto, é a de que atua na vida jurídica com personalidade diversa da dos indivíduos que a compõem. (CCB, art. 50 e 1024)

Natureza Jurídica

Diversas são as teorias que procurar explicar o fenômeno pelo qual um grupo de pessoas passa a constituir uma unidade orgânica, com individualidade própria e reconhecida pelo Estado e distinta das pessoas que a compõem. Podem elas ser reunidas em dois grupos: (1) o das teorias da ficção e o (2) das teorias da realidade.

(1) Teorias da ficção

Na sua vertente legalista essa teoria professa que a pessoa jurídica constitui uma criação artificial da lei, um ente fictício, pois somente a pessoa natural pode ser sujeito da relação jurídica e titular de direitos subjetivos.

Concebida desse modo a pessoa jurídica não passa de simples conceito, destinado a justificar a atribuição de certos direitos a um grupo de pessoas físicas.

Na sua vertente doutrinária a teoria também advoga no sentido de que a pessoa jurídica não tem existência real, mas apenas intelectual, ou seja, na inteligência dos juristas, sendo assim uma mera ficção, criada pela doutrina.

As teorias da ficção não são, hoje, aceitas, por sua incapacidade de explicar o Estado enquanto pessoa jurídica, já que dizer que o Estado é uma ficção legal ou doutrinária implica em dizer que o direito, que dele emana, também o é.

(2) Teorias da realidade

As pessoas jurídicas são realidades vivas, sociológicas ou técnicas, nascem, portanto, por imposição das forças sociais e se destinam a um serviço ou ofício.

Na vertente técnica, expressam a forma encontrada pelo direito para reconhecer a existência de grupos de indivíduos que se unem na busca de fins determinados. A personificação é atribuída a grupos em que a lei reconhece vontade e objetivos próprios, sendo, portanto, um atributo que o Estado defere a certas entidades havidas como merecedoras dessa benesse.

A teoria da realidade técnica é a adotada pelo direito brasileiro, como se depreende do art. 45 do CCB, que disciplina o começo da existência legal das pessoas jurídicas de direito privado, bem como dos arts. 51, 54, VI, 61, 69 e 1033 do mesmo diploma legal.

Requisitos para a constituição da Pessoa Jurídica

Para que a pessoa jurídica seja formada alguns elementos devem estar presentes: (1) uma pluralidade de pessoas ou de bens e uma finalidade específica (elementos naturais) e (2) um ato constitutivo e seu respectivo registro no órgão competente (elementos formais).

A vontade humana criadora – primeiro requisito para a constituição da pessoa jurídica – se materializa no ato constitutivo, que deve ser escrito e demanda a presença de duas ou mais pessoas com vontades convergentes, ligadas por uma intenção comum (affectio societatis).

O ato constitutivo – segundo requisito – é um elemento formal exigido pela lei e que se denomina estatuto (associações), contrato social (sociedade simples ou empresária) ou escritura pública ou testamento (fundações), de acordo com o que dispõe o art. 62 do CCB.

O ato constitutivo deverá ser levado a registro – terceiro requisito – para que tenha início a existência legal da pessoa jurídica de direito privado (CCB, art. 45), pois até esse momento não passa de sociedade de fato.

A liceidade do objetivo – último requisito – é indispensável, devendo o objetivo ser, também, determinado e possível. O objetivo das sociedades (civis e empresárias) é o lucro; das fundações só podem ser religiosos, morais, culturais ou de assistência (CCB, art. 62, parágrafo único); os objetivos das associações, de fins não-lucrativos, são de natureza cultural, educacional, esportiva, religiosa, filantrópica, recreativa, moral, etc. (CCB, art. 53)

Objetivos ilícitos ou nocivos constituem causas de extinção da pessoa jurídica. (CCB, art. 69)

A existência de pessoas jurídicas de direito público, por outro lado, decorre de outros fatores, como a lei e o ato administrativo, fatos históricos, de previsão constitucional, tratados internacionais, sendo regidas pelo direito público e não pelo Código Civil.

Começo da Existência Legal

A pessoa jurídica resulta da vontade humana, mas o impulso volitivo coletivo – nas associações e sociedades – e individual – nas fundações – formaliza-se no ato constitutivo, que pode ser estatuto ou contrato social, conforme a espécie de pessoa jurídica a ser criada.

O contrato social é a convenção por meio da qual duas ou mais pessoas se obrigam reciprocamente a conjugar esforços, contribuindo, com bens ou serviços, para a consecução de um fim comum mediante o exercício de atividade econômica, e a partilhar entre si os resultados. (CCB, art. 981)

Essa manifestação de vontade deve observar os requisitos de validade dos negócios jurídicos, exigidos no art. 104 do CCB.

A declaração de vontade pode revestir-se de forma pública ou particular (CCB, art. 997) com exceção das fundações para cuja constituição exige-se escritura pública (ou testamento), conforme art. 62 do CCB.

Algumas pessoas jurídicas, ademais, por estarem ligadas a interesses coletivos, dependem de prévia autorização do Governo Federal, como, por exemplo, as empresas estrangeiras, as agências ou estabelecimentos de seguros, cooperativas, instituições financeiras, empresas jornalísticas, etc.

A existência legal das pessoas jurídicas, entretanto, só começa efetivamente com o registro de seu ato constitutivo no órgão competente. (CCB, art. 45)

O registro do contrato social constitutivo de uma sociedade empresária far-se-á na Junta Comercial, e os estatutos das associações e atos constitutivos das demais pessoas jurídicas de direito privado serão feitos no Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas (CCB, art. 1150 c/c LRP, arts. 114 ss.), com exceção das sociedades simples de advogados, cujo registro será realizado na OAB. (EOAB, arts. 15 e 16,§3º)

O registro tem natureza constitutiva, por ser atributivo da personalidade jurídica, da capacidade jurídica, a qual não se limita a esfera patrimonial (CCB, art. 52), razão pela qual gozam as pessoas jurídicas da proteção dispensada aos direitos da personalidade – nome, boa fama, etc. – bem como possuem o direito de ser proprietárias, de contratar e de adquirir bens por sucessão causa mortis.

Os elementos que obrigatoriamente devem estar contidos no registro são indicados no arts. 46 do CCB, mas o procedimento registral é objeto de disciplina da LRP, em seu art. 121.

As pessoas jurídicas atuam através dos órgãos previstos no estatuto/contrato social, que são, geralmente, a diretoria e a assembléia geral de conselho deliberativo.

Os direitos e deveres das pessoas jurídicas decorrem de atos de seus diretores no âmbito dos poderes que lhes são conferidos pelo ato constitutivo. (CCB, art. 47)

O cancelamento do registro da pessoa jurídica, nos casos de dissolução ou cassação da autorização para seu funcionamento, não se promove mediante averbação, no instante em que é dissolvida, mas depois de encerrada sua liquidação (CCB, art. 51), mas o direito de anular a sua constituição por defeito do respectivo ato pode ser exercido dentro do prazo decadencial de três anos, contado da publicação e sua inscrição no registro. (CCB, art. 45, parágrafo)

Sociedades irregulares ou de fato

Sem o registro de seu ato constitutivo a pessoa jurídica será considerada irregular, mera associação ou sociedade de fato, sem personalidade jurídica e o seu registro tardio não retroage ao período anterior, aplicando-se-lhes, nessa fase os princípios reguladores das sociedades irregulares, conforme disciplina constante do livro concernente ao Direito de Empresa.

Nesse sentido, o art. 986 do CCB dispõe que: “Enquanto não inscritos os atos constitutivos, reger-se-á a sociedade, exceto por ações em organização, pelo disposto neste Capítulo, observadas, subsidiariamente e no que com ele forem compatíveis, as normas da sociedade simples”.

Por sua vez, o art. 990 do CCB determina que todos “os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais, de sorte que o patrimônio das sociedades não-personificadas responde pelas obrigações, mas os seus sócios têm o dever de concorrer com os seus haveres, na dívida comum, isto é, a responsabilidade incidente sobre o acervo repercute no patrimônio dos sócios, confundindo-se os direitos e obrigações daquelas com os destes.

Ademais, os sócios, nas relações entre si ou com terceiros, apenas poderão provar a existência da sociedade por escrito, “mas aos terceiros será permitida a utilização de qualquer meio de prova” (CCB, art. 987).

Os bens sociais respondem pelos atos de gestão praticados por qualquer dos sócios, exceto se houver sido celebrado pacto limitativo de poderes, que somente terá eficácia contra terceiro, se este o conhecer ou devesse conhecê-lo. (CCB, art, 989)

Às sociedades irregulares, representadas por quem lhes administra os bens é reconhecida legitimidade para cobrar em juízo eventuais créditos, não podendo o devedor arguir a irregularidade de sua constituição para furtar-se ao pagamento de sua dívida (CPC, art. 12, VII), mas, por não serem sujeitos de direitos, não podem as sociedades irregulares figurar como parte em contrato de compra e venda de imóvel, nem praticar atos extrajudiciais que impliquem alienação de imóveis, porque o Registro Imobiliário não poderá proceder ao registro.

As ações movidas contra as sociedades irregulares deverão ser propostas no foro do lugar onde elas exercem sua principal atividade, tido como foro competente. (CPC, art. 100,IV, c)

Grupos despersonalizados

Nem todo grupo social constituído para a consecução de um fim comum é dotado de personalidade, embora se reconheça direto de representação processual a eles, na maioria das vezes.

Nesse sentido, a lei prevê certos casos de universalidades de direito e de massas de bens identificáveis como unidade que, mesmo não tendo personalidade jurídica podem gozar de capacidade processual e ter legitimidade ativa e passiva para acionar e serem acionadas em juízo.

Essas entidades se formam independentemente da vontade de seus membros u em virtude de um ato jurídico que os vincule a determinados bens, carecendo, pois, de afectio societatis.

O CCB, em seu art. 91, considera a universalidade de direito o complexo de relações jurídicas de uma pessoa e o CPC determina a representação processual de boa parte dos grupos despersonalizados, em seu art. 12.

Destacam-se, dentre os diversos grupos despersonalizados:

(a) a massa falida, que é o acervo de bens pertencentes ao falido, após a sentença declaratória de falência decretando a perda do direito à administração e à disposição do referido patrimônio, a qual, embora não tenha personalidade jurídica, não podendo por isso ser titular de direitos reais nem contrair obrigações, exerce os direitos do falido, podendo agir inclusive contra ele, substituindo-o no campo processual, sendo representada pelo síndico, que é seu administrador.

(b) as heranças jacentes e vacantes, disciplinadas nos arts. 1819 e 1823 do CCB, que constituem o conjunto de bens deixados pelo de cujus, enquanto não entregue a sucessor devidamente habilitado, as quais não possuem personalidade jurídica, consistindo num acervo de bens administrado por um curador até a habilitação dos herdeiros, quando for o caso. Entretanto, reconhece-se legitimação ativa e passiva para comparecer em juízo.

(c) o espólio, que é o complexo de direitos e obrigações do falecido, abrangendo bens de toda natureza, consistindo em uma massa de bens não-personificada, que surge com a abertura da sucessão e subsiste até a partilha, representada pelo administrador provisório até a nomeação do inventariante.

(d) as sociedades irregulares (de fato, despersonificadas), que são representadas em juízo, ativa e passivamente, pela pessoa a quem couber a administração de seus bens.

(e) o condomínio, sobre o qual recai divergência teórica, assumindo alguns doutrinadores a sua condição, quando edilício, de pessoa jurídica, o que é frontalmente atacado por outros.

Classificação da pessoa jurídica

As pessoas jurídicas podem ser classificadas quanto à nacionalidade, à sua estrutura interna e à sua função (órbita de atuação), do seguinte modo:

(1) Quanto à nacionalidade, as pessoas jurídicas podem ser classificadas como (a) nacionais, quando organizadas segundo a legislação brasileira e com sede no Brasil (CCB, art. 1126 c/c CRFB, arts. 177, §1º e 222) ou (b) estrangeira, caso em que não poderá funcionar no país, sem autorização do Poder Executivo, qualquer que seja o seu objeto.

(2) Quanto à sua estrutura interna as pessoas jurídicas podem ser classificadas como (a) corporação, que se caracteriza por seu aspecto eminentemente pessoal, constituindo um conjunto de pessoas, reunidas para melhor consecução de seus objetivos, ou (b) fundações, nas quais o aspecto dominante é o material, pois compõe-se de um patrimônio personalizado, destinado a um determinado fim. As corporações buscam a realização de objetivos internos, estabelecidos pelos seus sócios, visando ao interesse e bem-estar de seus membros, enquanto os objetivos das fundações são externos, estabelecidos pelo instituidor. O patrimônio, nas corporações é secundário, serve à realização de um fim, enquanto nas fundações é o elemento essencial.

As corporações dividem-se em: (a1) associações e (a2) sociedades, as quais podem ser (a21) simples ou (a22) empresárias.

As (a1) associações não têm fins lucrativos, mas religiosos, morais, culturais, assitenciais, desportivos ou recreativos; já as (a2) sociedades têm fim econômico e visam lucro, o qual deve ser distribuído entre os sócios. As (a21) sociedades simples são, em geral, constituídas por profissionais de uma mesma área (escritórios de engenharia, advocacia, etc.) ou por prestadores de serviços técnicos. As (a22) sociedades empresárias se distinguem das simples por possuírem como objeto o exercício de atividade própria de empresário, sujeito ao registro previsto no art. 967 do CCB.

As (b) fundações constituem um acervo de bens, que recebe personalidade jurídica para a realização de determinados fins, compondo-se, portanto, de dois elementos: o patrimônio e o fim, estabelecido pelo instituidor e não-lucrativo.

(3) Quanto à função, ou órbita de atuação, as pessoas jurídicas podem ser (a) de direito público, que subdividem em (a1) de direito público externo e (a2) de direito público interno, ou (b) de direito privado, que são as fundações, associações e fundações, já mencionadas. (CCB, art. 44)

As (a1) pessoas jurídicas de direito público externo são os Estados da comunidade internacional, ou seja, todas as pessoas regidas pelo direito internacional público – nações, ONU, OEA, Unesco, etc. (CCB, art. 42)

As (a2) pessoas jurídicas de direito público interno podem classificar-se em (a21) da administração direta (União, Estados membros, Distrito Federal, Territórios, Municípios) e (a22) da administração indireta, que são órgãos descentralizados, criados por lei, com personalidade própria para o exercício de atividade de interesse público, tais como as autarquias e fundações públicas. (CCB, art. 41)

As (b) pessoas jurídicas de direito privado, são aquelas arroladas nos incisos do art. 44 do CCB, quais sejam: as associações, as sociedades, as fundações, as organizações religiosas e os partidos políticos.

O §1º do art. 44 do CCB dispõe que “são livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento”.

O§2º do art. 44 do CCB estende a regulamentação concernente às associações subsidiariamente às sociedades, que são objeto do Livro II da Parte Especial do Código, e o §3º do mesmo art. 44 proclama que “os partidos políticos serão organizados e funcionarão conforme o disposto em lei específica”.

As associações

As associações são pessoas jurídicas de direito privado constituídas de pessoas que reúnem os seus esforços para a realização de fins não econômicos (CCB, art. 53), amparadas pela garantia constitucional de liberdade de associação para fins lícitos. (CRFB, art. 5º,XVII)

Não há entre os membros da associação direitos e obrigações recíprocos, nem intenção de dividir resultados, sendo os objetivos altruísticos, científicos, artísticos, beneficentes, religiosos, educativos, culturais, políticos, esportivos ou recreativos.

As disposições concernentes às associações aplicam-se, subsidiariamente, às sociedades, ainda que o traço distintivo entre aquelas e essas é fato de que as associações não visam ao lucro, muito embora possam realizar negócios para manter ou aumentar seu patrimônio, desde que com isso não promova ganhos aos seus associados.

O art. 54 do CCB dispõe sobre os elementos necessários do estatuto das associações, destacando-se a previsão da exclusão do associado, que só poderá ocorrer havendo justa causa, assim reconhecida em procedimento que assegure direito de defesa e recurso, nos termos previstos no estatuto, conforme art. 57 do CCB.

A quebra do affectio societatis, dado o aspecto eminentemente pessoal das associações, pode constituir justa causa para a referida exclusão, sendo, ademais, permitido ao associado retirar-se a qualquer tempo da associação, pois “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou permanecer associado” (CRFB, art. 5º,XX), podendo, contudo, o estatuto, impor certas condições para a retirada, como o cumprimento de obrigações sociais eventualmente assumidas, por exemplo.

O art. 59 do CCB prevê que à assembléia geral compete privativamente a destituição dos administradores e a alteração do estatuto, para o que se exige convocação especial para esse fim, cujo quorum será estabelecido no estatuto, que também definirá os critérios para eleição dos administradores.

O art. 60 do CCB, por sua vez, prescreve que a convocação dos órgãos deliberativos far-se-á na forma do estatuto, garantido a 1/5 dos associados o direito de promovê-la.

A qualidade de associado é intransmissível, se o estatuto não dispuser o contrário (CCB, art. 56), podendo esse autorizar a transmissão, inter vivos ou causa mortis, dos direitos dos associados a terceiro, mas a transferência de quota ou fração ideal do patrimônio da associação ao adquirente ou herdeiro não importará, de per si, na atribuição a esses da qualidade de associados, salvo disposição diversa do estatuto. (CCB, art. 56, parágrafo único).

Em caso de dissolução da associação, os bens remanescentes serão destinados “à entidade de fins não econômicos designada no estatuto, ou, omisso este, por deliberação dos associados, à instituição, estadual ou federal, de fins idênticos ou semelhantes” (CCB, art. 61), podendo os associados, antes da destinação, receber em restituição as contribuições que tiverem prestado ao patrimônio da associação. (CCB, art. 61,§1º)

As sociedades

O novo Código Civil unificou as obrigações civil e comerciais no Livro II, concernente ao direito de empresa, disciplinando as sociedades, em suas diversas formas.

Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados, podendo a atividade restringir-se à realização de um ou mais negócios determinados. (CCB, art. 981)

As sociedades podem ser simples ou empresárias, sendo aquelas as que abrigam um amplo espectro das atividades de fins econômicos não empresariais, e se constituem, em geral, por profissionais que atuam em uma mesma área ou por prestadores de serviços técnicos (clínicas médicas, dentárias, instituições de ensino, etc.), com fim econômico ou lucrativo. Estas, por outro lado, embora também visem ao lucro, têm por objeto o exercício de atividade própria de empresário, sujeito a registro, conforme previstos no art. 967 do CCB.

Considera-se empresário aquele que “exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”. (CCB, art. 966)

As sociedades empresárias assumem as formas de: sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples, sociedade em comandita por ações, sociedade limitada, sociedade anônimas ou por ações. (CCB, arts. 1039 a 1092)

As fundações

As fundações constituem o acervo de bens que recebe personalidade jurídica para a realização de fins determinados, de interesse público, de modo permanente e estável.

Decorrem da vontade de uma pessoa, o instituidor, e seus fins, de natureza religiosa, moral, cultural ou assistencial, são imutáveis.

Podem ser particulares ou públicas, sendo essas instituídas pelo Estado, pertencendo os seus bens ao patrimônio público, com destinação especial, regendo-se por normas próprias de direito administrativo, enquanto aquelas são regidas pelo CCB, em seus arts. 62 a 69.

Da redação do art. 62 do CCB, depreende-se que a fundação compõe-se de dois elementos: o patrimônio e o fim, o qual é estabelecido pelo instituidor e não pode ser lucrativo, mas social, de interesse público.

A necessidade de que os bens sejam livres é intuitiva, pois a incidência de qualquer ônus ou encargo sobre eles colocaria em risco a própria existência da instituição, frustrando a realização de seus objetivos.

A constituição da fundação se desdobra em quatro fases:

(1) A do ato de dotação ou de instituição, que compreende a reserva ou destinação de bens livres, com indicação dos fins a que se destinam e a maneira de administrá-los, e que se realizará por ato inter vivos (escritura pública) ou causa mortis (testamento), conforme dispõe o art. 62 do CCB.

Os credores podem, eventualmente, anulá-la por fraude, se lesiva a seus interesses (CCB, art. 158), assim como os herdeiros necessários, se configurada sua inoficiosidade (CCB, art. 549).

Pode o instituidor, ademais, até o registro do estatuto da fundação, revogar a dotação formalizada por escritura pública ou por testamento, mas após sua morte, seus herdeiros não poderão pretender neutralizar sua vontade, a não ser no ponto que lhes ofendeu a legítima.

O art. 63 do CCB, em atenção à vontade do instituir, determina que sendo os bens insuficientes para constituir a fundação, serão eles incorporados em outra fundação que se proponha a fim igual ou semelhante.

O patrimônio da fundação pode ser constituído por diversas espécies de bens (imóveis, móveis, créditos, etc.), devendo o instituidor, feita a dotação por escritura pública, transferir-lhes a propriedade. (CCB, art. 64)

Ocorre que, mesmo com a criação direta da entidade pelo ato de dotação, ficará o bem no patrimônio do instituidor até o momento em que se operar a constituição da pessoa jurídica da fundação, mediante um procedimento complexo.

(2) A da elaboração do estatuto, que pode ser direta ou própria (pelo próprio instituidor) ou fiduciária (por pessoa de sua confiança, por ele designada). O instituidor pode elaborar o estatuto inteiro, como pode formular-lhe somente as bases, ou seja, as cláusulas gerais, que deverão ser desenvolvidas pelo administrador que aceitou a incumbência. Mas se não elabora o estatuto e tão pouco indica quem deva fazê-lo, ou, se indicando, esse deixa de cumprir o referido encargo, então o Ministério Público poderá tomar a iniciativa. (CCB, art. 65)

(3) O da aprovação do estatuto, que será realizada pelo Ministério Público, verificando se o objeto é lícito, se foram observadas as bases fixadas pelo instituidor e se os bens são suficientes, dentro de 15 dias, prazo em que poderá, alternativamente, indicar as modificações que entender necessárias ou denegar a aprovação (CCB, arts. 63, 65, 66 e 69), casos em que poderá o interessado requerer judicialmente o suprimento de aprovação, que será eventualmente concedido após da propositura de modificações no estatuto por parte do magistrado, como o fim de adaptá-lo aos fins pretendidos pelo instituidor. (CCB, art. 65,§1º c/c CPC, art. 1201,§2º). Ao juiz compete, também, aprovar o estatuto elaborado pelo Ministério Público em suprimento à omissão do instituidor ou da pessoa por ele encarregada de cumprir o encargo. (CPC, art. 1202)

Qualquer alteração no estatuto deverá ser submetida à aprovação do Ministério Público, devendo-se observar os requisitos exigidos pelo art. 67 do CCB, sendo que os fins ou objetivos da fundação não podem, todavia, ser modificados, nem mesmo pela vontade unânime de seus dirigentes, pois apenas o instituidor pode especificá-los e sua vontade deve ser prestigiada. (CCB, art. 62)

Se a autorização estatutária não houver sido aprovada por unanimidade, “os administradores da fundação, ao submeterem o estatuto ao órgão do Ministério Público, requererão que se dê ciência à minoria vencida para impugná-la, se quiser, em dez dias”. (CCB, art. 68)

Não podem os dirigentes, ademais, alienar, por qualquer forma, os bens da fundação, que são inalienáveis porque sua existência é que assegura a concretização dos fins visados pelo instituidor; contudo, a inalienabilidade não é absoluta, pois comprovada a necessidade da alienação pode esta ser autorizada pelo juiz, com audiência do Ministério Público, aplicando-se o produto da venda na própria fundação, em outros bens destinados à consecução de seus fins.

O Ministério Público, encarregado de velar pelas fundações (CCB, art. 66), poderá propor medidas judiciais para remover o ímprobo administrados da fundação, ou lhe pedir contas que está obrigado a prestar, e até mesmo poderá extingui-la, se desvirtuar as suas finalidades e tornar-se nociva. (CCB, art. 69)

4) do registro no Registro Civil das Pessoas Jurídicas (CCB, art. 1150; LRP, art. 114, I), que é indispensável, pois marca o início da existência legal da fundação (CCB, art. 45), devendo ser declarado, dentre outros dados, “o nome e a individualização dos fundadores ou instituidores e dos diretores” e “as condições de extinção da pessoa jurídica e o destino do seu patrimônio, nesse caso”, conforme dispõe o art. 46 do CCB. O art. 115 da Lei de Registros Públicos, dispõe, por sua vez, que “não poderão ser registrados os atos constitutivos de pessoas jurídicas, quando o seu objeto ou circunstâncias relevantes indiquem destino ou atividade ilícitos, ou contrários, nocivos ou perigosos ao bem público, à segurança do Estado e da coletividade, à ordem pública ou social, à moral e aos bons costumes”.

O desvirtuamento posterior ao registro constitui causa de dissolução da fundação, cabendo ao Ministério Público a iniciativa, se não o fizerem os sócios ou alguns deles. De fato, as fundações extinguem-se em duas circunstâncias: (a) tornando-se ilícita, nociva, impossível ou inútil a sua finalidade, ou (b) vencendo o prazo de sua existência. (CCB, art. 69)

A lei não estabelece prazo para a duração da fundação, mas o instituidor pode fixá-lo.

Em todos os casos, cabe ao Ministério Público ou a qualquer interessado promover a extinção da fundação e possibilitar, com isso, o atendimento de outras finalidades, com a incorporação do patrimônio a outra fundação de fim semelhantes, pois extinta a fundação, o patrimônio terá o destino previsto pelo instituidor, no ato constitutivo ou, na falta de previsão, será incorporado em outra fundação (municipal, estadual ou federal), designada pelo juiz, que se proponha a fim igual ou semelhante. (CCB, art. 69)

Extinção das pessoas jurídicas

As pessoas jurídicas nascem, desenvolvem-se, modificam-se e extinguem-se[1].

O começo da existência legal das pessoas jurídicas de direito privado se dá com o registro do ato constitutivo no órgão competente, mas o seu término pode decorrer de diversas causas, assumindo o ato de dissolução quatro formas distintas correspondentes às seguintes modalidades de extinção:

(a) convencional, que se dá por deliberação de seus membros, conforme quorum previsto nos estatutos ou na lei, já que a vontade humana criadora, hábil para gerar uma entidade com personalidade distinta da de seus membros, deve ser também capaz de extingui-la.

O art. 1033 do CCB dispõe que a sociedade se dissolve quando ocorrer a “deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado” ou na de prazo determinado, “quando houver consenso unânime dos sócios”.

Dissolvem-se, ainda, as pessoas jurídicas, pelo “vencimento do prazo de duração, salvo se, vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a sociedade em liquidação, caso em que se prorrogará por tempo indeterminado” (CCB, art. 1033,I); pela “falta de pluralidade de sócios”, se a sociedade simples não for “reconstituída no prazo de cento e oitenta dias”[2] (CCB, art. 1033,IV); pela morte de sócio, “se os sócios remanescentes optarem pela dissolução” (CCB, art. 1028,II); ou por “outras causas de dissolução”, previstas no contrato (CCB, art. 1035).

(b) legal, em razão de motivo previsto na lei, como, por exemplo, a decretação de falência, a morte dos sócios ou o desaparecimento do capital, nas sociedades de fins lucrativos, etc.

(c) administrativa, em razão da cassação da autorização do Poder Público para o funcionamento das pessoas jurídicas que dela necessitam, seja por infração a disposição de ordem pública ou prática de atos contrários aos fins declarados no seu estatuto (CCB, art. 1125), seja por se tornar ilícita, impossível ou inútil sua finalidade (CCB, art. 69), por motivação de qualquer do povo ou do Ministério Público.

(d) judicial, em razão de decisão judicial tendo em vista a configuração de algum dos casos de dissolução previstos em lei ou no estatuto, especialmente quando a entidade se desvia dos fins para os quais se constituiu.

O art. 1035 do CCB apresenta rol que elenca algumas situação que ensejam a dissolução judicial de pessoa jurídica, ao qual pode-se acrescentar, ainda, as hipóteses previstas nos arts. 69, primeira parte, 1028, II, 1033 e 1035 do CCB.

O processo de extinção da pessoa jurídica realiza-se pela dissolução e pela liquidação, que se refere ao patrimônio e concerne ao pagamento das dívidas e à partilha entre os sócios.

Dispõe o art. 51 do CCB que, nos casos de dissolução da pessoa jurídica ou cassada a autorização para seu funcionamento, “ela subsistirá para os fins de liquidação, até que esta se conclua”, quando então poder-se-á cancelar a inscrição da pessoa jurídica no registro competente.

Desconsideração da personalidade jurídica

O ordenamento jurídico confere à pessoa jurídica personalidade distinta da de seus membros, o que por vezes possibilita que as sociedades empresárias sejam utilizadas como instrumento para prática de fraudes e abusos de direito contra credores, acarretando-lhes prejuízo.

A teoria da desconsideração da pessoa jurídica (disregard doctrine) surgiu como reação a esses abusos e veio a permitir que o juiz, em casos de fraude e má-fé, desconsidere o princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, para atingir e vincular os bens particulares dos sócios à satisfação das dívidas da sociedade.

Em nosso ordenamento, tal teoria já havia sido incorporada pelo CDC e pela Lei nº 9605/98, que dispõe sobre atividades lesivas ao meio ambiente. O CCB, em seu art. 50 expandiu a aplicação da disregard para a vida associativa em geral.

Domicílio da pessoa jurídica

A pessoa jurídica de direito privado não tem residência, mas sede ou estabelecimento, que se prende a um determinado lugar, constituindo um domicílio especial, que pode ser livremente escolhido no seu estatuto ou atos constitutivos. Não o sendo, contudo, o seu domicílio será “o lugar onde funcionarem as respectivas diretorias e administrações” (CCB, art. 75,IV), considerado o local de suas atividades habituais, onde os credores poderão demandar o cumprimento das obrigações.

O STF sumulou entendimento segundo o qual a pessoa jurídica de direito privado poderá ser demandada no domicílio da agência ou estabelecimento em que se praticou o ato, em consonância com o §1º do referido art. 75 do CCB, que admite a pluralidade domiciliar.

Se a administração tiver sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da pessoa jurídica o lugar do estabelecimento situado no Brasil onde as obrigações foram contraídas, correspondente a cada agência. (CCB, art. 75,§2º)

As pessoas jurídicas de direito público interno, por outro lado, têm por domicílio a sede de seu governo. (CCB, art. 75).




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